02/05/2012

Sobre crônicas e garotas

Abro a janela, afasto a cortinas e vislumbro a calmaria das ruas de um domingo para o qual todos já têm planos. Uma moça bem vestida atravessa a rua por entre os carros que esperam abrir o sinal. Seus passos têm a firmeza necessária para derreter homens fortes, a determinação misturada ao céu dos olhos capaz de coagir os mais seguros rapazes. A peculiaridade no farfalhar de suas saias, os cachos perfeitamente alinhados que tocam a fineza da cintura bem-desenhada e a boca colorida por marcante vermelho-vivo, causam-me fascínio e torpor. O vento lhe encurta as saias e afasta os cabelos do dorso branco, recebendo sua indiferença igualmente dedicada aos pais de família, senhores idosos e moças que desejam a si próprias igual vitalidade. De meu pouco entendimento de seus segredos retiro inspiração para a crônica de segunda-feira que passará em branco aos olhos de muita gente e será talvez a cama onde dormitará um mendigo ou receberá em suas cuidadosamente escolhidas palavras dejetos de um animal doméstico qualquer. A moça que cruza minha rua nesse instante sem que eu saiba nunca de encontro a que destino, desconhece a poesia contida na brandura de seus atos que não a aprisionam em definição alguma. Quem sabe que pensamentos moram atrás dos olhos que recusam-se a luz por milésimos de segundo antes de mostrarem-se novamente azuis e vivos como nunca foram aos olhos imprecisos de um admirador? Seus passos firmes a mantém encantando as ruas adormecidas da cidade, enquanto todos fazem alguma coisa infinitamente mais útil que sonhar.

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