A velhice tem me levado a lembranças que são fósseis de sonhos postos em espera por princípios, ou outra dessas tolices que já nos ocuparam os dias. A mesma velhice que se mostra nesses dias tristes como só teus olhos sabem ser.
Já velhos somos, minha senhora – em minha mente tão moça -, e como tais, não temos direito a regalias das coisas que esperam. O tempo não mudou teus sentimentos de moça livre como fizera com tua face já tão disforme, a cada dia derramando sua beleza por rugas espessas, como as lágrimas que outrora me feriram como somente lanças afiadas e cravadas lentamente doem a um homem. E fui eu um homem, pois tinha barbas, uma casa, um emprego e alguém a desejar.
Hoje dessas dores não sofro mais, pois tu não mais choras. Tens olhos secos e um certo brilho perdido, que já fora razão do viver de muitos rapazes de nossa época de cores e sabores hoje inexistentes em nossas vidas tão escassas de quem beira a morte. E hoje, já caquética e de passos arrastados, mesmo hoje, com meus cuidados, me dói que em todos esses anos tu não tenhas aprendido a amar o que tens em mãos. É dessas que sempre irá querer o inatingível e viver a beira da história que jamais escreverá.
Já tanto te escrevi, moça, te enviara infinitas cartas que atualmente nem se usam, declarando essa beleza que via e ainda hoje vejo em ti, que tivestes em todas as fases da tua vida e agora se põe pelos dias, e se derrama por onde passas nas andanças lentas de quem não mais tem pressa.
Tal beleza que não soube ver em nenhuma das outras passantes por esse meu caminho cheio de pregos e pedras e desvios, com rios indecifráveis e histórias imemoráveis, diferentes de tuas idas e vindas todas recordadas em meus cadernos amarelos. Já tantas mulheres desejaram um poeta a sangrar assim por elas, de cabeça baixa e olhos entristecidos, sem saber mais onde encontrar moradia e sem querer abrigo em qualquer outra paragem. Mas tu não querias um poeta.
Querias um homem. E homens, nem hoje nem nunca foram criaturas permitidas ao choro, nem a qualquer dessas coisas proibidas como são as covardias e os medos. De homem só tinha as barbas, hoje tão brancas e finas, e essas coisas tão desimportantes a verdadeiras mulheres como eras tu. Precisavas – e ainda hoje precisas – da segurança que nem a mim saberia fornecer, nesses caminhos tristes, sempre a duvidar e questionar minhas escolhas nunca exatas.
Tu não temes a morte, e nisso vejo uma beleza que de pouco se entende. És corajosa e nisso só enxergo virtudes. Mas inebriados meus olhos se tornam quando te imagino, tão frágil e pequena, nos vorazes braços da morte a transpassar tua alma que és linda por si só. Te admiro como a poucas pessoas se pode admirar, pela teimosia de nunca me desejar. E isso é burrice, minha cara, mas nunca cheguei a dizer-te que poetas eram homens espertos.
Prosa carregada.
ResponderExcluir"mas nunca cheguei a dizer-te que poetas eram homens espertos."
discordo do teu eu-lírico, embora isso não seja relevante. Grande arte a tua.
abraços e té mais
antes arriscar tudo que você conquistou e tem como certo do que viver frustrado, sob a angústia de nunca saber se o futuro seria diferente ao lado daquela que você teve medo de abrir seu coração e implorar por uma chance.
ResponderExcluirexcelente texto (:
Adorei o post.
ResponderExcluirParabéns ficou muito bom, você tem talento.
Obrigada. já estou seguindo aqui.
Beijos.
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