06/07/2010

sem lucidez


Nós andávamos por aquelas ruelas, desprovidos de vergonhas e temores, desprovidos de ódio. Andávamos com as mãos coladas, como que sem perceber, e riamos como se nunca tivéssemos visto aquela velha cidade. Já tínhamos, muitas vezes. Mas era como se agora as coisas ganhassem cores. E como não? Éramos só dois curiosos, de mãos juntas intencionalmente, caminhando sobre as velhas pedras daquelas pequenas ruas, que já presenciaram tantas guerras e desafetos, mas ali estavam elas, tão mais bonitas à nossos olhos, graças a nossas breves presenças. Como se pudéssemos colorir tudo, pelo simples fato de que nossos olhos não poderiam ver nada triste. E quer algo mais tão inocentemente egocêntrico do que nós, tão desprovidos de ruindades e malícias? Porque só o que víamos eram cores, e tantas cores, como se estivéssemos no carnaval em pleno outubro. Era como se o mundo inteiro tivesse resolvido nos amar, no mesmo instante. E como nos sentíamos amados, e amáveis. Pois era disso feito o amor, de uma breve ilusão perfeccionista. E é uma grande pena que houve a lucidez para nos acordar daquele sonho, essa lucidez que veio ao longo dos anos. Nós crescemos. E quer coisa pior que isso? Perdemos o que de maior valor existia em nós, e eram aqueles sonhos simples, tão fáceis de sonhar.

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