11/10/2011


Andando de vagar, percorrendo as ruas como se percorre as páginas frágeis de um livro antigo, pra não se fragmentar a folha, arrastava os olhos pela noite sem lua. Nos prédios e nas casas, as luzes eram fachos integrantes da paisagem urbana. Como quis fugir dali. Como quis voltar pra cidade dos pais, todos conhecidos, todos aptos uns aos outros. Mas é preciso sair, dizem. Ele nunca disse, mas acreditava. Quem fica em baixo da asa da mãe ou é medroso ou é viado. Mas tinha assim quase que um medo, quase que uma sina, como se diz assim: uma certeza. Uma certeza de que à partir daquele dia também ele fazia parte. Parte daquele cenário, das luzes das casas, do olho negro invisível pra si lá em cima. Andou mais de vagar ainda. Podiam agora passar e tirar uma foto, pintar um quadro, ele também era paisagem, podia ser cartão postal. Os olhos correram por seus pés e agora seus passos – ele percebeu com a mesma certeza com cheiro de roupa guardada – pertenciam a uma rota que chamamos tão descuidadamente de destino. E o passo podia se acelerar, quem sabe na próxima esquina? Uma mulher, um amor, talvez ou homem. Porque não um homem? Agora era o coração descompassado que não conhecia mais, já tinha tanto tempo... Tinha medo do que iam falar. Por que é que falam? Por que é que julgam? Ele suspira porque amor é sempre amor, mas até a isso dão nomes, tem quem ame do jeito não convencional. Puxa um cigarro e houve as buzinas e nos olhos e nos postes vê o aceitável: ninguém entende. Não há revolta nenhuma, é só um cara andando pela rua com medo de sentir. Todo dia a mesma rota, se bem que às vezes se altera um pouco, nenhuma festa, já havia um bom tempo, nenhum amigo. Vinha correndo tanto, hoje queria conhecer um lugar diferente, mas não tinha com quem, só com os próprios pés e a certeza de finalmente existir naquele lugar naquele instante. Aumenta o passo. Ninguém sabe o que se passa, ninguém. Às vezes se julga conhecer uma pessoa e ter certeza de que ela pensa assim, afinal ela disse, mas pode ser uma invenção ou sabemos aonde ela vai e supomos que ela gosta dessa vida, mas pode ser só por pressão. Ninguém conhece ninguém e ele quer tanto conhecer. Anda mais rápido. Todos sabem ser distantes mesmo estando perto, sabia? É quase um dom. E quer tanto estar perto e ser de verdade também pra alguém e não só pra um lugar qualquer. Agora ele corre.

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